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Clube de futebol é condenado a indenizar jogador que sofreu infarto durante treino

Em princípio, as doenças congênitas são consideradas como excludentes da configuração do acidente do trabalho. Porém, como em toda regra, existem exceções. No caso analisado pela 2ª Turma do TRT-MG foi justamente o fato de o reclamante ter uma doença de família que confirmou a responsabilidade do réu. Nessa linha foi o entendimento adotado pela juíza convocada Rosemary de Oliveira Pires, ao julgar o recurso de um jogador de futebol que sofreu um infarto durante um treinamento realizado no clube do futebol em que atuava. Ele insistia na tese de acidente do trabalho e pedia o pagamento de indenizações por danos morais e materiais. E, após analisar as provas do processo, a magistrada deu razão a ele.

O juiz de 1º Grau havia afastado a culpa do clube de futebol, entendendo que foram realizados os exames necessários e rotineiros para verificação das condições de saúde do reclamante. Mas a relatora teve uma visão completamente diferente sobre o caso. A perícia médica realizada nos autos constatou que o reclamante tem uma doença coronariana, agravada pelo fato de ser portador de trombofilia por deficiência de proteína C. Apesar de tratar-se de doença congênita, a julgadora não teve dúvidas de que o trabalho realizado para o clube contribuiu para o infarto. Ou seja, atuou como concausa, tema previsto no artigo 21 da Lei 8.213/91.

Segundo pontuou a magistrada, a atividade de jogador profissional de futebol configura atividade de risco, tanto que a lei 9.615/98 prevê que o clube contrate seguro obrigatório de vida e acidentes pessoais. O réu explora a atividade futebolística por meio de seus atletas profissionais, tendo pleno conhecimento do risco desse esporte. O risco é acima do normal das profissões em geral. A Lei 9.615/98 exige o acompanhamento médico dos atletas profissionais, tanto que os clubes mantêm departamento médico para atendimento de seus atletas.

Nesse contexto, a julgadora não aceitou justificativa: o clube deveria ter promovido exames que detectassem a doença do reclamante. Até porque realizar todos os exames necessários à investigação de doenças congênitas contraindicadas à prática desportiva é obrigação dos clubes contratantes. Isto é imprescindível para evitar riscos à saúde e à vida dos atletas, inclusive com morte súbita.

O reclamante começou a atuar no clube aos 12 anos, como atleta “em formação” e, aos 18, firmou o seu primeiro contrato. Mesmo assim nenhum documento que pudesse contribuir na análise do histórico clínico que antecedeu o infarto foi encontrado. Conforme observou a magistrada, não houve apuração médica preventiva suficiente. Ao contrário, o atleta foi mantido em atuação, sendo inclusive medicado pelo clube com remédios contraindicados aos portadores de cardiopatia. Na visão da julgadora, o caso a atrai a aplicação tanto da responsabilidade objetiva como da subjetiva.

Ela também chamou a atenção para o fato de que, depois do infarto, já contraindicado para a prática profissional do futebol, o atleta veio a ser novamente contratado, antecipadamente. Não apenas por dois anos, normal da prorrogação, mas por três anos. E por quê, se o atleta não tinha condições físicas de jogar? Na renovação contratual foi inclusive previsto o encaminhamento ao INSS. Por quê o clube antecipou e arcou com os custos de seus salários, prevendo a complementação ao benefício do INSS e outras vantagens? Por quê não aguardou o término do contrato em curso para recontratar o jogador? Para a relatora, é evidente: a renovação visou encobrir a culpa que o clube já reconhecia. E o pior: buscava alcançar a prescrição do direito de ação. “Tal implicava em mantê-lo no clube por mais 5 anos após o infarto, sendo ele (o clube) sabedor que é esse o limite máximo de duração contratual previsto na Lei 9.615/98… e também o da prescrição trabalhista!!”, frisou a julgadora.

Todas as questões do processo foram minuciosamente analisadas pela relatora, que, ao final, chegou à seguinte conclusão: a doença congênita não é capaz de afastar a responsabilidade do réu. Pelo contrário, no caso, a reforça. Houve clara negligência do clube, que contribuiu para a ocorrência do infarto repentino e grave (concausa), capaz de provocar sequelas definitivas no atleta. Como ponderou a relatora, se o clube tivesse agido com a prudência que a exploração de seu ramo empresarial exige, teria concluído que o jogador, portador de trombofilia por ausência de proteína C, jamais poderia ter sido atleta profissional. Ele corria risco de morte, mas isso só foi confirmado quando teve o fatídico infarto agudo do miocárdio. A prática desportiva profissional foi, nesse cenário, reconhecida como concausa do acidente do trabalho, uma vez que, associando-se à doença congênita do reclamante, contribuiu como fator desencadeante e agravante do dano por ele sofrido.

Diante desse contexto, a relatora decidiu modificar a sentença e condenar o réu ao pagamento de indenização por danos materiais, através de pensão mensal, no valor equivalente ao salário vigente na época do acidente do trabalho, até o limite temporal de 35 anos de idade. Para tanto, levou em consideração que o reclamante nunca poderia ter sido um atleta profissional. Por outro lado, ponderou que, ao negligenciar a apuração da doença e mantê-lo na ativa, o clube criou uma falta expectativa de vida profissional. Daí o motivo de o pensionamento até os 35 anos.

O clube de futebol também foi condenado ao pagamento de indenização por danos morais, no valor equivalente a 16 salários do último contracheque do reclamante, e, por fim, a quitar a indenização pelo seguro previsto na Lei 9.615/98, já que a contratação não se deu como determina a lei. A Turma de julgadores acompanhou os entendimentos.

Fonte: TRT-3

Santos, Polido & Advogados Associados

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