Investidor que é cessionário de 1.747 contratos de participação financeira da Telecomunicações São Paulo S/A (Telesp) não tem direito ao mesmo foro privilegiado do consumidor originário, que é o usuário da linha telefônica. Apesar de ter legitimidade para pleitear em juízo diferenças das ações, a ele se aplica a regra comum de definição de foro prevista no Código de Processo Civil (CPC).
O entendimento é da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao julgar recurso em que o detentor das ações da Telesp buscava foro privilegiado – em seu domicílio – para requerer diferença da composição acionária, conforme prevê o pelo Código de Defesa do Consumidor (CDC).
A Quarta Turma entendeu que a transferência, no caso, foi das ações tituladas e dos acessórios a ela vinculados, não dos direitos que decorriam diretamente do contrato. A Turma considerou que o autor da demanda não adquiriu as ações na condição de usuário dos serviços de telefonia, mas na qualidade de investidor.
Privilégio de foro
O autor da ação ingressou no Juízo de Florianópolis com a alegação de que era cessionário dos direitos resultantes dos contratos de participação financeiros firmados com a Telesp. Alegou que teria direito de ajuizar a ação em seu domicílio por força do artigo sexto, inciso VII, e artigo 101, inciso I do CDC, pois adquiriu todos os direitos decorrentes da transferência de ações, inclusive em relação à hipossuficiência dos assinantes.
A Telesp opôs exceção de competência, ao argumento de que a ação deveria ter sido proposta na cidade de São Paulo, sede da empresa, conforme previsão do CPC.
No julgamento em primeiro grau, o juízo de Florianópolis reconheceu a competência para julgamento da ação, mas o Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC) deu provimento à apelação para afastar do cessionário a qualidade de consumidor.
No entendimento do tribunal catarinense, o negócio jurídico tem natureza híbrida, em que há duas obrigações distintas. De um lado, a oferta de um terminal telefônico e, de outro, a retribuição em ações pelos investimentos realizados. Segundo o TJSC, nesse último, que é o objeto da ação principal, não há relação de consumo, por não haver fornecimento de produto ou serviço, mas meramente investimento no mercado de ações.
Jurisprudência
A jurisprudência do STJ reconhece a existência de relação de consumo nos contratos para a aquisição de linha telefônica com cláusula de investimento em ações. Mas, conforme a jurisprudência do STJ, consumidor nos contratos de participação financeira em questão é o destinatário final dos serviços.
Segundo o relator do recurso no STJ, ministro Luís Felipe Salomão, a jurisprudência tem mitigado os rigores da teoria finalista para autorizar a incidência do CDC nas hipóteses que a parte se encontra em situação de vulnerabilidade, embora não seja tecnicamente a destinatária final do produto ou serviço.
O consumidor, no caso, não demonstrou ser usuário dos serviços de telefonia. “A peça vestibular revela que não há nenhuma demonstração do intento de uso das linhas telefônicas, mais precisamente de 1.747 serviços de telefonia”, disse o ministro.
Cessão de direitos
O ministro observou que houve desmembramento dos direitos dos cedentes. Ocorreu, segundo ele, cessão parcial apenas daqueles direitos referentes às diferenças entre as ações subscritas. Os direitos de uso dos serviços de telefonia pelos compradores originários ficaram mantidos.
“A mera cessão dos direitos à participação acionária acabou por afastar justamente a relação jurídica base – uso do serviço de linha telefônica –, que conferia amparo à incidência do CDC”, afirmou Salomão.
É por essa razão, segundo o ministro, que o STJ vem reconhecendo a manutenção da posição contratual do consumidor originário. Se este depois cedeu ou transferiu a terceiros as ações subscritas, nem por isso perdeu a sua posição contratual, advinda do contrato que firmou, o que garante a ele o direito de ir a Justiça na condição de consumidor para pedir a diferença.
Salomão destacou que a transferência, no caso, foi das ações tituladas e dos acessórios que a ela estavam vinculados, não dos direitos que decorriam diretamente do contrato, e que ficaram na titularidade do subscritor primitivo, pois é dele, e não do cessionário, o prejuízo sofrido.
O ministro destacou que não há, como alegado, cessão automática da condição de hipossuficiência do consumidor. O magistrado deve analisar, no caso, a qualidade do autor da ação para verificar se esse se encontra na mesma situação pessoal do cedente.
Fonte: STJ
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