Um reclamante pediu na Justiça do Trabalho a condenação de seus ex-empregadores ao cumprimento de obrigações trabalhistas, como a anotação de sua carteira de trabalho, entre outras. Em sua ação, ele indicou como reclamados uma microempresa, uma grande indústria de móveis e dois sócios da microempresa. Mas, após analisar os documentos juntados ao processo, o juiz Alexandre Reis Pereira de Barros ficou surpreso ao descobrir que o reclamante não era empregado, mas, sim, sócio da microempresa. Em sua atuação na 32ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte, o magistrado se deparou com essa situação inusitada e constatou que o reclamante mentiu em juízo, uma vez que sequer alegou fraude na modalidade de contratação com o intuito de mascarar a alegada relação de emprego.
No caso, o juiz sentenciante observou que os comprovantes de entrega postal da notificação para os dois sócios da microempresa reclamada foram assinados por pessoas diferentes. Para evitar uma possível alegação de invalidade da citação, o magistrado determinou, por cautela, que fosse feita a pesquisa dos endereços dos sócios da microempresa junto ao sistema INFOJUD. E nessa pesquisa foram constatados endereços diferentes dos mencionados na petição inicial, fato que levou o julgador a examinar o contrato social, juntado ao processo pelo próprio reclamante, a fim de verificar os motivos que teriam levado o autor a indicar endereços errados dos sócios da microempresa. “E qual não foi a minha surpresa, ao constatar que o reclamante também era sócio!” , pontuou o magistrado.
O documento comprovou que o reclamante ingressou na sociedade em 22/08/2012, com 10% de participação. O julgador observou que a data do registro da alteração contratual é, inclusive, compatível com a data indicada na petição inicial como tendo sido de início da prestação de serviços. Conforme acentuou o juiz, não há indícios de que o caso seja de sociedade de “fachada” ou de eventual fraude para “mascarar” uma suposta relação de emprego, até porque nada disso foi mencionado pelo reclamante na petição inicial. Ele alegou apenas que teria sido contratado sem registro em sua CTPS, mas não disse que teria sido, por exemplo, obrigado a integrar a sociedade, sob pena de não ser admitido, ou que teria havido algum vício de consentimento, de forma a tornar nulo o contrato social. Portanto, o julgador concluiu que, sendo o reclamante sócio da microempresa e válido o contrato social, ele não poderia pleitear direitos tipicamente trabalhistas, a começar do registro da CTPS.
Diante desse quadro, o juiz sentenciante indeferiu o pedido de concessão do benefício da justiça gratuita pelo fato de o reclamante ter mentido em juízo, o que, na visão do julgador, faz cair por terra a presunção de veracidade contida na declaração de pobreza. Ademais, o fato de ser empresário também faz presumir que o reclamante possui condições de arcar com os encargos processuais. Como o reclamante faltou com a verdade ao omitir situação essencial para a correta compreensão de todas as particularidades da causa, com evidente prejuízo ao direito de defesa dos demais reclamados, o juiz sentenciante o condenou ao pagamento de multa correspondente a 1% do valor da causa, além de 10% a título de indenização pelos prejuízos causados à indústria de móveis.
Ao finalizar, o julgador deixou registradas na sentença as suas impressões sobre o caso: “O que concluo é que, com o encerramento das atividades da primeira Reclamada, houve alguma desavença entre os sócios e o Reclamante resolveu se vingar ou mesmo transportar para uma ação trabalhista suas eventuais insatisfações, até mesmo em função das notórias vantagens desse tipo de ação, em relação às que tramitam na Justiça comum, quando sócios se desentendem. Mas o fato, para resumir e para terminar (que esta ação já tomou tempo demais do Judiciário), é que o Reclamante era sócio da primeira Reclamada e em momento algum alega ou comprova que tal situação seria nula ou fraudulenta. Registro, para que não se alegue omissão, que as conclusões acima tornam irrelevante a revelia da primeira Reclamada, não se lhe aplicando, portanto, a pena de confissão” .
O reclamante recorreu da decisão, mas o recurso não foi aceito porque o recorrente não pagou as custas e nem o depósito recursal, requisito indispensável para a admissão do recurso, já que houve condenação em dinheiro (multa por litigância de má-fé).
Fonte: AASP
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