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Moral e ética no trabalho

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É sabido que a moralidade e a ética da sociedade variam com o tempo. Os alemães utilizam uma palavra especial, que é Zeitgeist, que significa “espirito da época”.

Não há hoje quem defenda a escravidão, mas há menos de duzentos anos era não somente aceita, como plenamente defendida por intelectuais e por várias religiões.

O voto feminino era proibido na França antes de 1945, na Bélgica antes de 1946 e na Suíça antes de 1971.

Ícone da sociedade democrata americana, Abraham Lincoln já disse: “sou favorável a que a posição de superioridade seja designada à raça branca”. Em 1902, H.G. Hells era considerado um escritor progressista, mas encontramos em “Nova República” uma frase que demonstra a moralidade da época: “E como a Nova República tratará as raças inferiores? Como ela lidará com o negro? (…) com o homem amarelo? (…) o judeu? (…)”.

Assim é que o homem sempre se julga moralmente superior na época em que vive. Atualmente vemos uma sociedade cada vez mais atenta à ética e moralidade social.

A sociedade se volta contra a discriminação e contra a corrupção, exigindo leis e políticas públicas positivas que as eliminem.

Quando se pretende eliminar a corrupção, as pessoas ficam indignadas com as fraudes, que dilapidam o patrimônio público. Afinal, os “outros” não podem roubar aquilo que pertence a todos, ou seja: quando praticam fraudes, acabam por me roubar também.

Entretanto, no dia-a-dia vemos que fraudes são o que os outros fazem e não o que nós mesmos fazemos.

No universo trabalhista não é rara a fraude bilateral, realizada de forma conjunta entre empregadores e empregados contra o dinheiro público, e acham que não estão fazendo nada errado, assim como aqueles que eram contra o voto feminino, ou a favor da escravidão, ou da superioridade de alguma raça, achavam que não estavam fazendo nada errado.

As fraudes podem ser de várias formas. Relatarei apenas duas mais comuns do dia-a-dia: Empregado necessita de dinheiro e faz um “acordo” com o empregador para que seja dispensado ficticiamente, receba o saldo do FGTS e parcelas do seguro desemprego por alguns meses, e continua a trabalhar sem registro, até esgotar o recebimento das parcelas, retornando ao emprego formalmente ao final desse período.

O empregador libera o FGTS fora das hipóteses legais, e comunica uma dispensa fictícia. Obviamente pratica fraude contra o sistema do FGTS, cujos recursos são direcionados para várias atividades relevantes ao país. (veja aqui), descritas na Lei nº 8036/90, tais como habitação popular, saneamento básico e infraestrutura urbana, ensejando por seu levantamento indevido, o comprometimento dessas finalidades.

Também pratica fraude contra o sistema do seguro desemprego, pois declara um desemprego inexistente, e faz com que recursos públicos sejam destinados fraudulentamente a quem não tem direito ao recebimento.

Obviamente o empregado pratica a fraude, pois aufere o benefício do seguro-desemprego sem preencher o requisito essencial, que é estar desempregado.

O seguro-desemprego é recurso público. Cerca de 3% dos benefícios do seguro-desemprego pagos anualmente são irregulares. Como o valor pago é de aproximadamente 27 bilhões de reais (confira aqui), o que representa que a fraude contra o sistema deve atingir aproximadamente 800 milhões de reais! Ou seja, o valor das fraudes seria suficiente para manter na escola aproximadamente 363 mil alunos do ensino fundamental.

A obtenção pelo empregado, e a facilitação pelo empregador (tanto o que informa desemprego inexistente, quanto o que emprega, mas não registra para permitir ao empregado a continuidade no recebimento) configuram crime:

(…). FRAUDE PARA OBTENÇÃO DE SEGURO-DESEMPREGO. (…).  No caso em apreço, inaplicável o postulado permissivo, eis que evidenciada a relevância do comportamento perpetrado pelo paciente, que, mediante fraude, obteve dos cofres públicos valores a título de seguro-desemprego; dessa forma, referido delito não se identifica como um indiferente penal, pois as consequências são gravíssimas e estão além do mero prejuízo monetário ou financeiro, pois afetam a própria credibilidade dos programas sociais do Governo. (…)”  (Superior Tribunal de Justiça: HC 187.310/PA, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, QUINTA TURMA, julgado em 03/05/2011, DJe 07/06/2011)

É interessante como os fraudadores tentam justificar seus atos: criam histórias. Alegam que “os políticos roubam” (generalização) e de alguma forma estariam fazendo um “favor ao mundo” em diminuir o valor que “eles roubariam”, ou ainda alegam que o exemplo tem que vir de cima e que, portanto, o que fazem nada mais é do que o reflexo desses políticos, assim a culpa por ele fraudar é porque o outro fraudou antes e em maior volume.

O erro de raciocínio é evidente. Em primeiro lugar porque nem todos os políticos roubam. Em segundo lugar porque o exemplo tem que vir da sociedade, que é quem deve dirigir e determinar o padrão ético dos políticos, e em terceiro lugar devemos ser imitadores do que os outros fazem de errado;

Aos empregadores, gostam da manobra porque se sentem credores de um favor que fizeram ao empregado, além de lucrarem com a diminuição dos recolhimentos legais (FGTS e INSS) do período de afastamento.

Por fim, há de se verificar que embora causem prejuízos aos cofres públicos, tal prática é ainda muito aceita entre empregadores e empregados, que muitas vezes, quando alertados por advogados ou contadores, dizem-se surpresos. O problema é que mesmo que aleguem ingenuidade, estão sujeitos a serem réus em processos criminais, e até mesmo a serem presos:

“Patrão e empregado de uma indústria têxtil de Toledo foram presos pela Polícia Federal de Cascavel acusados de fraudarem o Seguro-Desemprego. Denúncia apontava que o trabalhador recebia o benefício, apesar de estar trabalhando. Policiais federais e um fiscal do Ministério do Trabalho foram até a empresa na tarde de segunda-feira e constataram a fraude. Os presos, que não tiveram os nomes divulgados, devem responder por estelionato contra órgão público. Segundo o delegado da PF, Marcos Rogério Rezende Silvestre, ao empregador ainda implica a falta de anotação do contrato de trabalho e o fato de ter  deixado de pagar a contribuição previdenciária. “Apesar de ser uma prática comum, essa foi a primeira prisão que fizemos por esse tipo de crime, pois é necessário ter a denúncia e elementos suficientes para o flagrante”, comentou o delegado. O delegado Silvestre ressaltou ainda que a fiscalização sobre esse tipo de crime será intensificada. Depois de ouvidos na  delegacia da PF de Cascavel, os presos foram encaminhados à carceragem da Polícia Civil de Toledo. Caberá à Justiça decidir sobre a soltura deles. (Neo Gonçalves) (Fonte: O paraná, edição 10.381 de 16/06/2010 pág. B8)

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