O decreto 7.962, que regulamenta o CDC quanto ao comércio eletrônico, passa a vigorar a partir de amanhã com alterações significativas para os consumidores.
O crescimento do comércio eletrônico no país – que em 2012 faturou R$ 22,5 bi nas compras B2C e R$ 1,65 bi nas compras coletivas1 – explica a urgência na necessidade de regulamentação do tema, como ressalta Vanessa Cristina Santiago, gerente da área empresarial do Gaia Silva Gaede & Associados: “Como o CDC foi concebido em um momento em que o comércio eletrônico não tinha a relevância que tem hoje, este acabou por não tratar expressamente do tema.”
Isso não significa que os consumidores estavam órfãos de legislação que os amparasse, diz Vanessa. Tanto é que o advogado Marcos Gomes da Silva Bruno, sócio da banca Opice Blum, Bruno, Abrusio e Vainzof Advogados Associados, lembra que o decreto acaba reproduzindo regras que já existiam de forma implícita no CDC, como por exemplo a obrigação de trazer informações claras ao consumidor, bem como disponibilizar canais de atendimento adequados. “Mas trazer de forma explícita essas regras facilita a fiscalização por parte dos órgãos de proteção ao consumidor”, destaca.
Direito de arrependimento
O decreto 7.962 abrange especificamente os seguintes aspectos: informações claras a respeito do produto, serviço e fornecedor; atendimento facilitado ao consumidor; e respeito ao direito de arrependimento.
Particularmente quanto ao direito de arrependimento, Marcos Gomes da Silva Bruno pontua que o assunto de fato foi sempre polêmico. “O fato da pessoa não poder tocar no produto, ver detalhadamente, ou seja, a impessoalidade da compra é que garantia o direito ao arrependimento”.
Entretanto, em alguns casos o grau de informação da compra on-line é muito maior do que na loja física. “Um caso nítido seria a compra das passagens aéreas: pela internet há mais informação do que com um agente de viagens”, exemplifica o causídico. Diante desta questão, Gomes da Silva Bruno frisa que inclusive já há decisões judiciais que entendem pela inaplicabilidade do direito de arrependimento, quando constatado de fato esse grau de conhecimento do consumidor antes da aquisição do produto ou serviço. “Discussões ainda vão existir, e levado ao Judiciário, muitos juízes podem seguir esse entendimento do grau de conhecimento do consumidor”, alerta.
O causídico ressalta também que, uma vez cancelada a compra, todos os contratos acessórios também o são, como os custos do frete, sem ônus ao consumidor. “Até então, cada lojista adotava uma política nesse sentido, o que deixava o consumidor perdido. Agora, a questão encontra-se pacificada”, assinala.
Quanto à operacionalização do direito de arrependimento e prazo de exercício, Vanessa Cristina Santiago entende que deve ser aplicado o que consta no CDC, “logo, a priori, não seria necessária previsão, no decreto, neste sentido”.
Compras coletivas
O faturamento com a modalidade de compras coletivas no Brasil teve um crescimento nominal de 8% em 2012 em relação a 20112. O número de ofertas adquiridas, no entanto, teve um crescimento bem acima: foram 25,3 milhões de pedidos, um avanço de 30% em comparação a 2011.
Não atingido o número mínimo e caso realmente o serviço não puder ser prestado, a regra é devolver o valor. Porém, há críticas de que o decreto não é claro quanto ao prazo para devolução do montante pago. “De todo modo, entendo que o parágrafo único do art. 4º confere um norte nesse sentido. Pela leitura do inciso [V] e do parágrafo, entendo possível interpretar que a demanda do consumidor deverá ser endereçada em até cinco dias. Inclusive, arrisco dizer que, na medida em que o fornecedor detém as informações do consumidor e saberá, de pronto, se a oferta atendeu ou não o número mínimo de participantes, pode haver a interpretação de que o fornecedor deverá entrar em contato com o consumidor tão logo saiba que a proposta não atendeu o número mínimo de consumidores, a fim de orientá-lo sobre como se dará o reembolso. Quanto aos custos dessa tramitação, por toda a sistemática do tema, entendo que estes ficarão por conta do fornecedor”, explica Vanessa. No mesmo sentido vai a interpretação do advogado Marcos Gomes da Silva Bruno, para quem sempre foi direito do consumidor ser ressarcido e isso agora fica positivado pelo decreto.
Reação
Há pontos sensíveis no documento para o varejo. De fato, uma reunião entre as maiores redes (Netshoes, Casas Bahia e Ponto Frio, Walmart.com e outras) e a Câmara Brasileira de Comércio Eletrônico deu origem a um documento, entregue à Secretaria Nacional do Consumidor do MJ, com esclarecimentos sobre as questões que, segundo eles, precisam de análise imediata: o já citado direito de arrependimento e os procedimentos de reembolso.
No caso do primeiro, as lojas alegam que o direito não cabe a quem “usou e não gostou”, e também não abarcariam todos os produtos, como por exemplo a entrada para o cinema ou a compra de filmes e livros. Quanto aos custos de devolução, o varejo on-line argumenta que não é possível arcar com as despesas de retirar o produto na casa do cliente, pois trata-se do risco do negócio.
Apesar da discussão sobre o e-commerce não se encerrar com as novas regras, sua validade é celebrada: “Os macro pontos de interesse foram atendidos. A questão agora é verificar se a regulamentação trazida pelo decreto é satisfatória especialmente se considerarmos a dinâmica dos meios de comunicação”, pondera Vanessa.
Fonte: Migalhas
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